“Um dia descobri que gostava de brincar com meninas , as brincadeiras mais banais de menino não me diziam nada, durante toda a minha infância . Daí, nunca imaginar que um dia iria gostar de alguém do mesmo sexo. Pudera! Era apenas uma criança inocente. Quando entrei na adolescência, eis que continuava a preferir andar rodeado de raparigas e, não é que, nessa adolescência quando eu deveria começar a descobrir sentimentos por elas, eu descubro que sinto o mesmo que elas . Comecei, pois então, a descobrir que gosto ou sinto interesse por eles . Tinha eu 16 anos quando, realmente, me senti apaixonado e, é nessa altura, que começou um grande dilema na minha vida. Dilema, porquê ? Porque eu não conhecia nada e ninguém do “mundo gay”. Começaram os meus medos, as minhas dúvidas , mas que fazer ? Comecei então a distanciar me de todos. Até que, um dia, consegui desabafar com uma amiga e contei que amava o Daniel que, por ironia do destino, a minha amiga era prima do Daniel . Ela riu mas riu muito e, no meio do riso, ela diz-me que o Daniel também se sente gay. Alguns dias passaram e, eu e o Daniel começamos a namorar. Um namoro que só nós dois e a prima Sara sabíamos. Um amor escondido que durou quase 4 anos. Daniel foi o meu primeiro amor e, fomos felizes ás escondidas mas, um dia fomos separados. Não foi por falta de amor , não por culpa de alguém , não porque alguém nos tivesse descoberto , mas sim porque a vida nos separou. Por volta dos meus 20 anos, o Daniel perdeu a vida num trágico acidente de mota. Chorei muito e, sofri em segredo, mas a vida lá foi seguindo o seu rumo. Decidi então emigrar para França. Pensei sempre que, chegando a França ,que poderia assumir o que era e, o que queria, mas nas várias tentativas percebi que a família não ia aceitar , tive medo e desiste por várias vezes. O tempo foi passando e iam me apontando o dedo. Os primos e os irmãos casaram todos e eu fiquei solteiro. mas, esse facto não me fez sentir pressionado para casar. Pois é, foi mesmo ironia do destino. Conheci uma senhora e, com ela casei e com quem tive duas lindas princesas , minhas filhas que tanto amo. Três anos passaram e, eu sentia uma angustia enorme, pois aquela não era a vida que eu desejava,vivendo numa ilusão e, por isso, sofria em silêncio. Não nego que, por imensas vezes traí a minha esposa , procurei sempre bares para ter as minhas aventuras e, para sentir o prazer que não conseguia ter em casa. Aconteceu que, numa dessas aventuras conheci alguém que me fez apaixonar. Pois foi, essa paixão, que me fez dar um passo , sair do armário. Aos 27 anos começou a batalha da minha vida. Saio do armário , assumo a minha relação e descubro o inferno.
A família desprezou me , a maior parte dos amigos abandonaram me ,os meus irmãos renegaram me e a minha própria mãe desejou me a morte. Eu senti me imundo, com vergonha e, tentei fazer a vontade à minha mãe ou seja…, a primeira tentativa de suicídio. O meu companheiro, nessa fase, também me abandonou. Três meses depois de um coma profundo, acordo, e penso mudar de vida para fazer a vontade à família. Saí do hospital e não tive ninguém para me receber. Enfim, cheguei a casa… segunda tentativa , e uma simples lavagem de estômago salvou me. Tinha então, que seguir a vida , rejeitado, abandonado e ofendido decidi mudar . Conheci, nessa altura, um rapaz brasileiro que achei que era um anjo e, juntos fomos para o Brasil. Só que ,depois de tanto sofrer, por causa da minha família, ainda tive de enfrentar o preconceito da família dele. Como não aceitei isso, por muito tempo, voltei a Portugal e, seis meses depois, o rapaz veio ter comigo. Foi aí o meu erro , nunca o deveria ter feito, pois fui traído e roubado . Com tanto sofrimento surgiu a terceira tentativa de suicídio . Pois é, tentei, mas acredito que o meu anjo Daniel me salvou mais uma vez. Depois disso tudo, decidi viver , mas viver para mim , nesse momento, fui eu que rejeitei tudo e todos . Comecei a ter uma vida só para mim e somente para mim. Levantei a cabeça e segui em frente. Voltei para França em 2013 onde está toda a minha família , foi fácil ? Não , não foi , a mesma família, a mesma mãe e os mesmos irmãos continuaram com as mesmas atitudes de há alguns anos atrás. A diferença é que , agora, o Lipe já não tinha medo e já não se deixava intimidar. Vivi as minhas aventuras e os meus amores . Gosta quem gosta, aceita quem aceita , para mim deixou de fazer doer. Pois é, o Lipe aprendeu a rejeitar, a desprezar e a ignorar. Com toda essas experiências, aos poucos e poucos ,encontrei a minha estabilidade. Conheci pessoas fantásticas que estão sempre presentes na minha vida. Pessoas, que me aceitam e que me apoiam .E, encontrei também a pessoa que vive atualmente comigo. Tentamos ser felizes à nossa maneira sem se associar àquilo que os preconceituosos pensam. Enfim aos 37 anos sou feliz . Obrigado Daniel por sempre me teres salvo. Desejo a todos que leiam o meu testemunho e que estão a passar, o que passei, que abram os olhos e deixem de lado tudo aquilo que vos faz mal. Sejam felizes à vossa maneira.” Lipe
Publicado por: Ruben Silva
03/10/2016